quinta-feira, agosto 17, 2006

Prova dos Nove

Hoje é o meu segundo dia em São Paulo. Sempre quis conhecer essa cidade, não só pela grandeza, pelos museus, pela vida noturna ou mesmo pela promissora 25 de Março (será que eu encontro um mp3 player por menos de R$ 100?). Queria conhecer para ter a minha opinião sobre ela. Sim, porque São Paulo é um lugar que se ama ou se odeia, não dá pra ficar em cima do muro. Antes de vir, ouvi desde elogios rasgados sobre como a cidade é limpa, organizada e tem polícia em quase toda esquina até os mais velhos clichês sobre a selva de pedra cruel e desumana na qual eu seria assaltada, estuprada e morta. E como as coisas ruins quase sempre ecoam mais forte em nossos corações, os dias que antecederam a viagem foram muito difíceis. Fiquei me perguntando o que faria lá (quer dizer, aqui). Claro, vim com um objetivo justo e bem definido, que era pesquisar filmes para a minha dissertação e, de quebra, ter umas merecidas férias, saindo do esquema praia do Ceará. Mas depois fiquei com medo. E se não desse certo? E se eu não encontrasse o que eu estava procurando (e não estou falando somente da minha pesquisa)? E se eu acabasse passando quinze dias trancada em casa, com medo de sair na rua?

O que eu sei é que meus medos se desfizeram na hora que entrei no avião, na madrugada de terça-feira. Senti que eu precisava fazer essa viagem. Precisava de outra temperatura, outras roupas, outras comidas, outros cheiros, outras pessoas, outro eu. Precisava, sobretudo, de uma alternativa, nem que fosse por quinze dias. Gosto da minha vida em Fortaleza, da minha família, dos meus amigos, das minhas atividades. Mas tem horas que a gente se cansa de tudo: o pensamento tacanho, o machismo, as limitações, as pessoas que acham que sabem o que é melhor pra você, o calor, o forró desmantelado, tudo. Aí é hora de conhecer outras coisas, lidar com outros códigos, não importa se você vai se adaptar a eles ou não.

Um dia antes de viajar, meu irmão comentou que jamais teria coragem de ir a São Paulo sozinho por tanto tempo. E olha que ele é um homem de quase 30 anos! Então eu olhei pra ele e respondi: “É porque eu sou ousada!”. Parece uma resposta boba, vinda de uma caçula que quer provocar a família. Nunca na minha vida me senti ousada, apesar de morar sozinha desde os catorze anos e de outras coisas que nenhuma das minhas amigas fez ou viveu. Mas a verdade é que eu estava dizendo aquilo para mim mesma, que eu era corajosa e forte o suficiente para enfrentar o desconhecido. Que eu era diferente do restante da minha família, mais apegada ao lugar onde nasceram e a uma vida calma e previsível. Que não deixaria as pequenas coisas me afastarem do caminho que tracei para mim mesma. Que mesmo que tivesse que sofrer eu não desistiria, a despeito de todas as previsões ruins que costumam fazer sobre mim. Tem horas que a gente precisa ser mais forte do que nós mesmas. Encontrar forças que não conhecia ou mesmo que não tinha para lidar com essa vida-rapadura (que é doce, mas também é bem dura). Estou tentando. São Paulo é meu estágio probatório.